04 junho 2013

Meia luz

Rendo-me aos grandes poetas neste pequeno palavrear.
Eis que escrevo sem muito pensar, sem saber exatamente o que irei dizer na linha seguinte. Perdoem-me então pela desconstrução destes parágrafos, pela falta de conectivos.
É que hoje eu queria falar da meia luz.
Hoje não!
Desde muito.
Acontece que venho colecionando instantes de minha amada que preciso urgentemente exponenciar. Então queria dizer eu, antes de dormir, quão penetrável fica a pele dela quando posta à meia luz. 
Seja naquele teatro de muitos atores, quando seu perfil emergiu da escuridão, banhado pelos pontos obtusos de uma luz que, mesmo não devendo, a atingia. Senti ciúme da luz.
Que dizer então dos ombros dela, ah, que ombros! Inundados de luz amarelada, mas sempre meia. Meia luz. Ela na ponta da cabeceira, eu tentando domar a ânsia de domá-la para comunicar: meu bem, estou te amando feito louco.
Resguardei o óbvio.
Por fim, o vértice de meu desespero: minha amada refletiu a tela do cinema. Pele sulfite que abrigou uma hora e meia de convergência sentimental. 
Não vi o filme, mas vi seus traços. Vi vestígios de linhas sombreadas que desciam de sua testa, resvalavam pelo nariz e mergulhavam na boca. Vi legendas naqueles lábios meus, vi um bando de atores nos olhos que riam - veja só, olhos que riam! (Espero que compreendam quando enfatizo).
Na incerteza da escuridão, era ela quem me separava de uma cegueira completa. Quando me capturou, que dó!, a sua boca abriu passagem, curvou-se para cima e surgiu na meia luz o diagnóstico para meu coração festeiro. Acreditem-me os sábios, os cultos, os doutrinados, eruditos e instruídos, ou apenas os loucos de amor: é dela o sorriso mais lindo dos mundos.

Agora, exatamente agora, como que por catástrofe do destino que me põe a recordar, alguém toca piano no andar de cima. Não sei o nome da canção, não sei se foi Chopin ou Mozart quem a tornou famosa. Mas é lenta. É um som doce, escorregadio para as mãos do pianista. Parece flutuar. Assim como o fronte dela à meia luz - a única imagem que consigo visualizar sentado aqui, de olhos fechados, trilhado pelo pianista oculto.
Já no fim, perdoem-me os leitores por respingar amor em demasia nestas palavras. É que, antes de dormir, eu precisava falar de minha amada. 
De minha amada na meia luz.

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