16 setembro 2012

Por tanta coisa

Eu te troquei por tanta coisa que nem tenho direito de pedir perdão. Mesmo gostando da ideia de estar ao teu lado, permiti que você fosse embora sem lutar contra a sua despedida. Para mim, o porquê disso sempre foi muito claro: eu não sabia lidar com tanto amor. Ou, melhor, acho que julguei não ser merecedor de tanto.
Eu te troquei por outra boca com gosto de cigarro, eu te troquei por outras quintas-feiras que não tiveram a mesma graça. Veja só, até mesmo as palavras deixei de lado. E, para um escritor, isso é o fim. Entrei em coma, mas para mim estava tudo bem.
Eu te troquei porque sou assim, infelizmente. Abandono as coisas boas para correr atrás das péssimas e tentar transformá-las em boas. Acho que a vida é muito grande para, tão cedo, ter um amor tão perfeito que faria dela uma jornada um tanto quanto sem graça. Eu gosto da tempestade, e você da calmaria. Taí o nosso primeiro erro. Eu me tornei leitor e você foi quem restou como responsável por criar alguns textos. Tudo, então, virou completamente de cabeça para baixo.
Eu te troquei porque não estava pronto, porque a ideia de montar um apartamento me pareceu assustadoramente doce e encantadora. Hoje, voltei a encher o saco porque percebi que você foi embora. Bem quando você pensava que quem já havia partido era eu, sendo que sempre estive aqui. Talvez eu não encontre amor maior nesse mundo, alguém que vá usar meu colar mesmo quando eu partir, alguém que vá vestir as mesmas roupas no quinto dia da semana. Mas, bem, eu não voltei a escrever para pedir esse amor de volta. Não o tive, não o terei. Porque você é o final feliz, e eu sou o clímax tempestuoso que ninguém nunca acaba entendendo. Aquela parte do filme que fica mal explicada, que todos odeiam, mas que deixam de lado por desistência. Ninguém gosta de quebrar a cabeça por algo que nem importa mais.
Eu te troquei por tanta coisa. E é você quem devia ter me trocado.

07 setembro 2012

Como daquela vez

Encontrei teus olhos quando já não esperava encontrar mais nada. E, bem, ainda que tivesse sido uma única vez... Mas não! Foram várias. Teu olhar oblíquo e dissimulado capturou o meu umas três ou quatro vezes, e durante todas elas eu tentei entender o porquê. Na verdade, ao chegar em casa, eu ainda estava pensando nisso. Noite passada a minha cama - aquela mesma que um dia você já repousou - registrou pensamentos inéditos nos últimos meses, sobre o sujeito oculto que já havia ido embora e subitamente retornou para preencher a oração principal.
No entanto, acordei hoje com aquela sensação meio bizarra: o que foi mesmo que fez teu olhar cruzar com o meu? Pois estou certo de que coincidência está fora da jogada. Porém, também não posso evitar a opção de que me olhavas unicamente por maldade, por jogo sujo. Incoerente, eu sei, porque estou falando de você. Ontem, então, após alguns meses de espera em uma estação que nunca imaginei estar (viver ao teu lado foi uma das promessas que eu já fiz a mim), o teu vagão apareceu e eu, em receio, não quis entrar. Quem sabe fosse uma emboscada, quem sabe a partir de agora nunca voltemos a nos falar. E, quanto a isso, eu acho que o melhor a se fazer é aceitar. E foi assim que eu deixei o teu vagão partir sem mim - outra vez.
Mas há algo que eu preciso confessar: ontem à noite, nós dois chegamos muito perto, sim. E, meu bem, você não sabe o quanto a proximidade pode ser satisfatória em alguns casos. Esbarrei minha mão na tua, porém quanto a isso eu acho que você não se recorda (afinal você segurava uma garrafa de cerveja, quando um dia segurou a mim). E saiba que nesse toque tudo voltou: não só teu vagão à minha estação, como também a lembrança de um livro que ganhei de presente e sublinhei todas as frases que me lembravam você, os teus irmãos que tive de desenhar mentalmente pois nunca cheguei a conhecê-los (eu acho que me daria bem com eles), todas as vezes que um dia eu me contive para não te beijar e, no fim, um arrependimento tardio.
Então vem e me diz que tá tudo errado. Que essa briga sem sentido é tão infantil quanto o nosso afastamento. Estou esperando isso, estou esperando você. Como daquela vez, quando errei por ciúmes e você me perdoou. Como daquela vez que você deu um jeito para que eu chegasse em casa. Como daquela vez que o mundo pensou que um dia ficaríamos juntos 'para todo o sempre' - e eu também. Como daquela vez que o taxista olhou pelo retrovisor e viu o nosso beijo. Como daquela vez que você sentiu ciúme de mim e eu tive a certeza de que ter te deixado ir embora, fossemos bons amigos ou um casal apaixonado, foi o pior erro do mundo.