30 abril 2013

Obrigado por não entender

Julieta estava em prantos. Aprisionava dentro de si uma tristeza que ninguém poderia imaginar que carregava consigo. Nos olhos, lágrimas de sal que pouco representavam a tristeza propriamente dita. O gosto das pequenas gotas era uma miscelânea de raiva e desespero sufocado.
Presa no quarto, Julieta não ousou abrir a porta. Quis correr para longe, mas o máximo que alcançou foi a lua. A lua que aguardava na beirada da sacada. De mãos atadas, bradou: 'Romeu, Romeu, onde estás, Romeu? Quisera que soubesse o vazio que preenche meu peito sofrido. Eles não entendem, Romeu!'.
Ali perto, salpicando pelas ruas tão rápido quanto brasa que foge do incêndio, estava o jovem Romeu. Este que, ao parar para escutar o despejo soturno de sua amada, não tardou em agir: escalou a parede de tijolos descascados e fez dos seus braços uma nova fortaleza para a moça. 'Julieta, minha amada, o meu desejo era dar-te toda a minha alegria, transpor meu sorriso para teus lábios, mas isto nem em beijo consigo. Então vou levar-te daqui.'
Fugiram num velho cavalo e chegaram ao meio do nada. Beijaram as estrelas, trocaram olhares apaixonados que deveriam ser o suficiente. 'Eles não entendem, Romeu', voltou ela a falar. 'Eles não entendem que lhe amo'.
Eis que Romeu sorriu.
Abriu os braços, gargalhou, deu voltas ao redor de si. E, vestido de noite, gritou para o enfim infinito daquele precipício: 'Obrigado! Obrigado por não entender!'
Ajoelhou-se e pegou na mão da amada. Cravou-lhe os lábios com vontade, mirou seus olhos e disparou: 'Casa-te comigo, Julieta. Mas casemo-nos na lua!'
Julieta soube. Julieta apenas soube. 
E Romeu voltou a gritar: 'Que o amor seja para sempre isto: um punhado sem sentido que até o maior dos filósofos duvide. Que nenhum poeta saiba discorrer, que físico algum saiba exemplificar em números. Que sempre haja alguém contra, que nem todos sejam a favor. Assim, saberemos o seu valor. E, principalmente, o quanto vale a pena lutar por ele! Obrigado! Obrigado por não entender!'
A moça só conseguia rir.

Desde então, dizem que Romeu e Julieta se mataram. Mais: mataram-se por não haver espaço para tamanho amor aqui na Terra. Que mataram-se porque ninguém entendia e os aceitava.
Já eu, lhes digo: Romeu e Julieta foram para a lua se casar.

Um comentário:

  1. Cara que texto perfeito, muito lindo mesmo. Principalmente a descrição de como deve ser o amor no final, foi épico.

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