06 abril 2012

Maldita hora

Meia noite e eu espero. Luzes apagadas e um silêncio proposital. Não fecho os olhos pois temo acordar já no dia seguinte, e prometi à minha consciência que conversaríamos hoje. Então eu estou aqui, na quietude de meu quarto transformado em sala de espera. Vem e me explica como vai ser, pois para mim ainda não ficou claro. Fala baixinho que o teu ciúme é assim e não vai mudar. Eu lhe direi sem nem recear que gosto muito dele. Enquanto tu percorre o meu corpo com o teu dedo indicador, ouça as minhas reclamações. Meu bem, eu amo demais, sinto mais do que deveria. Demonstro tudo tão descaradamente. E eu preciso de uma resposta, um sinal de fogo. Devolva-me o que te dou, mostre-me um pouco de você também.
Quando o teu dedo para em meus lábios - o sinal claro para que eu cesse com as palavras -, fecho os olhos pela primeira vez. Espero novamente, quase petrifico-me no mesmo lugar. Essa cama de solteiro que agora serve para dois será testemunha mais uma vez de como eu sou uma presa tão fácil para ti. E é aí que a tua boca chega devagar, cumprimentando a minha em uma saudação melodiosa. Eu sempre soube que elas se encaixavam tão bem, até mesmo quando eu não podia prová-la. Dançando juntos nós perfuramos a noite e a transformamos em madrugada. Nessa hora dedos já se tornaram mãos e os nossos corpos enroscam na tentativa de se completar. Compõem-se então a vontade. Nós, as duas peças de um quebra cabeça recomendado para crianças acima de três anos. Tão fácil de montar.
Ar quente, aos poucos não consigo mais respirar. Mas de novo estás lá, em prontidão para me socorrer. Respiração boca a boca. Peito contra peito. Batidas cardíacas aceleradas. A minha pele reconhece a tua e queima em uma vontade indubitável. Coleciono em meu interior partículas de ti. Roubo a cada segundo algo que me agrada, sem nem pensar que ainda não tivemos uma conversa. Pare, pare de me beijar. Estou bravo, não quero prosseguir com isto. Precisamos esclarecer essa relação, porém isso se torna impossível quando cravo as minhas unhas nas tuas costas, deslizando-as na intenção de provocar uma dor satisfatória. Percebo então que esse é o teu jeito de se doar para mim. Tua pele nutre meu ser do mesmo jeito que te supro com amor. Está aqui a nossa troca, é assim que funciona. Maldita hora que eu escolhi para conversar. Quem sabe então não deixamos aquela discussão para amanhã. Até lá, por favor, mantém a tua boca na minha.

2 comentários:

  1. " Até lá, por favor, mantém a tua boca na minha." perfeito o texto? sim, perfeito.

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