19 fevereiro 2013

A Maria

A Maria é aquele tipo de guria inteligente. Senta em qualquer canto da classe e mesmo assim tira dez em Física, que dirá então em Português. A Maria é bem reservada, está presente quando os pais precisam, vai ao teatro e sabe tocar banjo. Todos os caras da cidade babam por ela, e sempre que ela passa eles deixam cair o queixo. A Maria é bonita. A Maria é linda! Mas a Maria não ficaria com nenhum deles, são todos iguais. Eu bem que deveria me perguntar porque a Maria deu moral pra mim, mas vai ver é porque eu sou diferente.
E nem de longe eu poderia reclamar, hein?! Os caras vivem falando que a Maria é que nem o prêmio da Mega Sena, mas eu sou o único que não acha que ela é loteria. A Maria é, entretanto, um troféu: tem uma bunda gostosa, olhos meio perversos (mas inocentes), caminha meio rebolativa, e a boca... Porra, aquela boca! Boca que eu já provei, que investiguei, que gostei, fiquei, não troquei e ainda retornei. Então, novamente: que poderia reclamar eu?!
Acontece que a Maria só me encontra lá depois do riacho, lá onde ninguém pode nos ver. Ela ri um pouquinho, me prende no seu corpo, possui minha carência por um momento que logo em seguida já não existe mais. Ô Maria, vê bem o que tu faz! Me chama pro amor, roubo teu sabor, e depois deixa tudo pra trás. Vai me abandonando que nem passarinho, voando devagarinho, deixando incapaz esse tolo rapaz. E minha consciência vira turbulência, sinto querência na tua ausência, pra enterrar o amor eu preciso de pás. Paz! Paz que não tenho, quando não te tenho, e eu poderia deixar tudo assim, mas... Maria, Maria! Deixou minha prosa coagindo com a poesia, nem me venha com esse teu tanto faz. Maria, Maria! Ô Maria! Que bem tu faria. Se ficasse aqui eu até te a...Maria um pouquinho mais.

16 fevereiro 2013

Então é isso: acabou

Tu tá no teu melhor vestido e ele nem pra aparecer. Faz dois meses que tu passou a escolher muito bem cada roupa antes de sair de casa, resgatou aqueles LP's com as músicas que ele escuta e até leu grande parte dos clássicos só para ter o que conversar com o cara. O pessoal da biblioteca bem que estranhou você trocar a sessão de romances infanto juvenis pelos amontoados filosóficos recheados de palavras que tu tem de correr pro Google pra entender - nem mesmo o dicionário tu usa.
E aí tu espera um pouquinho como se já não tivesse esperado antes. Porque ele te deixou esperando na internet, deixou com que tu quase escancarasse o quanto queria beijar ele - porque ele nunca daria o braço a torcer. E tu esperou tanto que ele te beijasse, sendo que na maior parte das vezes isso não aconteceu. Ele nunca nem ligou pra dizer um boa noite, até amanhã guria; não reparou que tuas unhas tão pintadas de vermelho; ou que hoje, mas só hoje, tu prendeu a tua franja pra que ele possa analisar teu rosto por completo.
A droga do tempo passando te eleva para o próximo passo na noite naufragada: o conformismo. Tu se convence de que ele não vai aparecer, que se arrumou por nada, que ele é um merda que nunca te mereceu. Tu lembra de tudo que fez por ele - os mimos feitos a mão e as cartas de uma típica apaixonada da era Vitoriana. Mas deu, chega. Não precisa mais fingir gostar de Bossa Nova quando tu adora um pop batido pra se deixar levar na balada. Haha, balada. Tu ainda lembra o que é isso? Ei, olha aí, até mesmo essa xícara de chá que tá na tua frente é uma ilusão que acaba de cair por terra, porque na verdade tu gosta mesmo é de refrigerante! 
Então é isso: acabou. Ele não vai aparecer e tu vai é embora antes que qualquer conhecido te veja ali, sentada sozinha na mesa de uma cafeteria que tu nem sabia existir no centro da cidade. Tu vai embora se perguntando o quanto valeu a pena se entregar para acabar assim, sozinha. Mas aí tu te lembra que, ao lado dele, tu sempre esteve sozinha também. Porque, mesmo se esforçando para ser o que ele sempre quis (sua estúpida!), ele nunca te deu valor. Veja bem, tu tá no teu melhor vestido e ele nem pra aparecer.



13 fevereiro 2013

Em tanto lugar

Pensando bem, eu já estive em tanto lugar.
Já estive em uma cama que podia me oferecer todo o amor imaginado, mas quis estar naquela onde eu figuraria apenas como parque de diversões por uma noite. Já estive debaixo de um sol inspirador e quente quando na verdade quis estar debaixo de uma tempestade devastadora. Eu já estive em abraços nos quais mal sabia o nome de seus donos, e já estive em lugares que nem mesmo quis estar.
Eu já estive em lanchonete fast food querendo estar num jantar a luz de velas. Já estive na praia querendo estar na neve, e na neve querendo estar na praia. Eu já estive no trabalho e desejei estar em casa, eu já desejei ter um trabalho para pode sair um pouco de casa. Já estive no cinema com aquelas paixonites de adolescência e nós até hoje não sabemos dar a sinopse completa do filme que 'assistimos'. Eu já estive em várias segundas-feiras querendo estar logo nas sextas, já estive sufocado em um beijo que dias depois quis outra dose, já estive bebendo o que horas depois vomitei.
Eu já estive em outro país e constantemente quero voltar a estar. Eu já estive com Fulano pensando como estava Ciclano, e hoje nem sei por onde andam esses dois! Já estive na lua, já estive noutro planeta, e poucas vezes eu já estive aqui, na Terra mesmo. Eu já estive meio branco e preto, procurando incessantemente pelo colorido. Já estive em um relacionamento enrolado querendo torná-lo sério, mas em contrapartida já estive em um relacionamento sério querendo vê-lo chegar ao fim. Eu já estive meio drama, meio comédia, meio samba e meio tango. Eu já estive todos os ritmos musicais ao mesmo tempo!
Já estive meio lá, e hoje estou meio aqui. Quem sabe amanhã onde eu vou estar? Pensando bem, eu já estive em tanto lugar.

08 fevereiro 2013

Por quem você passa batom?

Saia curta e decote controlado. Quem tu tá querendo impressionar? Tuas amigas dizem que o cara d'outro lado do bar tá te dando moral, mas tu custa em acreditar. Eu tô bem assim, eu tô bem comigo mesma. Eu sou suficiente! Esse batom cor rubro me deixa madura, independente. Mas aí tu se permite uma dose de tequila e o garçom já oferece outra de graça. Tu logo já tá rindo, atropelando alguns assuntos, aceitando a ideia de que sozinha tu só sabe mesmo é passar batom, mas nem o teu sorriso e a marca dele nos copos conseguem tirar essa pintura dos teus lábios por completo do jeito que ele conseguiria.
Se liga, guria. Existe um ele na tua vida sim. Talvez tu nem saiba o nome, telefone, em que bar ele se esconde, ou em que supermercado ele faça as compras todo mês. Quem sabe demore um pouco, talvez seja um sufoco, mas, veja lá, quem sabe ele apareça quando você menos esperar. Pode ser no elevador, pode ser pra curar tua dor. Pode nem ser no teu andar! 
Se liga, guria. Esse batom é muito forte pra que qualquer um possa olhar. Esconde isso, deixa que alguém o sonegue, e por enquanto a minha dica é esta: apenas sugere. Usa o vermelho, sim, mas usa dia sim, dia não. Vê se não banaliza esse teu rosto tranquilo e não deixa qualquer um te passar a mão! Homem pra uma vida toda é aquele que venha a se apaixonar pela cor do teu batom. Sim, exatamente, porque é nele que se esconde o riso, é por ele que sai a conversa, é dele que nasce o beijo. Então vê se escolhe direito essa cor, e que ela seja a cor do amor!
Se liga, guria. Tu olha no espelho e tá sempre a imaginar. Será que é hoje?  Será que eu acertei? Será que ele vai me olhar? Nem vem querer tentar disfarçar, nem vem com essa história de que esses lábios só são marcados porque você quer ficar bonita pra si mesma. Tá, tu te gosta assim, e se sentir bem consigo é coisa de bom tom, mas confessa e diz pra mim: Por quem você passa batom?

01 fevereiro 2013

Apanha(n)do da saudade

E quem um dia chegou a duvidar da saudade?
Ela sempre existiu mesmo. Saudade tem sempre um nome, um cheiro, uma cor ou um lugar. A saudade mora em São Paulo, Austrália, Nova Iorque ou no Japão. Mora aqui, mora lá. Ela é aquele vermelho-cereja  da camiseta que ele usou na primeira noite em que vocês saíram, é marrom-chocolate como a cor daqueles olhos que te encontraram tantas vezes, é tão verde que quase se confunde com a esperança de que ele ou ela possa voltar. A saudade pode ser um nome, masculino ou feminino, por vezes composto ou com tanto sobrenome difícil que você nem sabe escrever direito. A saudade é aquele aroma adocicado ou aquela essência amadeirada que ficou tão presa num canto da memória que você jura senti-la quando passa na rua despreocupado. Seu trouxa!
A saudade também é aquela conversa desajeitada, algumas risadas e choros na madrugada, os filmes que vocês prometeram assistir até o fim mas que foram interrompidos porque passar o tempo beijando quem se ama é a melhor opção. Saudade é aquele sentimento que mistura vergonha, vontade e medo quando se está no primeiro encontro, mas que acaba se transformando em ausência, tristeza e dor quando tudo termina. Não quero arriscar e dizer que a saudade é aquilo que não se falou - ou aquilo que se falou demais! Não quero deixar claro que a saudade pode ser querer voltar no tempo, porque provavelmente as coisas sejam como realmente deveriam ser - e a gente só precisa aceitar. Mas o que eu sei é que a saudade é um tipo de dor, daquelas que não se encontra remédio preciso na farmácia e que só se cura com aquela fórmula do esquecimento chamada tempo. E quando cura!
Quando bate na porta e a gente atende, a saudade invade a nós como intrusa mal educada. Ela logo vai preenchendo cada espaço vazio e trazendo de volta à superfície aquilo que tanto lutamos para manter lá no fundo. A saudade grita, a saudade fala em voz alta. Mas saudade também pode ser silêncio. A saudade, na verdade, ao que se sabe, também é rima. É uma música - ou talvez duas, três, quatro, cinco, ou até um disco inteiro. Saudade é letra, palavra, poema, prosa, livro, novela. A saudade pode ser estática como uma fotografia ou fugaz como um vídeo. Pode ser uma segunda-feira de cinema, as quartas de pizza ou as sextas de sol. A saudade pode ser todos os dias da semana, todos os meses do ano. Aquele ano!
Saudade é um brinde que vem com a vida, todo mundo ganha. Todo mundo sente saudade. Seja do filho que foi fazer intercâmbio, da mãe que foi ver se o céu é um lugar melhor mesmo, ou do 'amor da minha vida' que resolveu que, exatamente agora, o problema é ele e não eu. A saudade quase sempre está ligada ao amor. Amor que sentimos pela infância, pelo cheiro de areia da praia, pela música do CD esquecido na estante, pelas cartas escritas que agora já não são motivo para resgatar um relacionamento, pelo chocolate que não é mais fabricado ou por qualquer outra coisa que nos faça pensar. Saudade é isso, é pensamento. É martelar o que já não mais está aqui. Insistência, insistência. Até que ponto é válido senti-la?
A saudade é mesmo traiçoeira. Acomete, se mete, e quase nunca se esquece. Do beijo, do abraço, do momento, do sentimento. O que resta é recordar essa falta que é tão necessária, e acreditar que, sim, nós todos precisamos até mesmo da saudade para que não esqueçamos o quanto algo - ou alguém - já nos fez feliz algum dia. Conclui-se então que a saudade é uma felicidade que foi dar uma volta. Mas será que volta? Bem, só nos resta esperar.