29 janeiro 2014

Se os brindes do Mc Lanche Feliz fossem livros



Tentei entender porque Dandara não ia embora. Era negra, mas não cheirava a café. Sorriso branco, os dentes - estes sim - parecendo de leite. Rebolava feito bambolê, que em câmera lenta vai para a esquerda, desliza um pouco e finge cair, mas logo está lá para a direita, e continua nesse vaivém hipnotizante. De enlouquecer qualquer homem. Porém, contudo, todavia, entretanto, queria que ela se fosse. Queria que batesse a porta e livrasse minha cama do seu corpo sinuoso na noite seguinte. Meu desejo havia sido ela, sabe como é, mas dia após dia o casinho virava casamento e disso eu tava fora. Obrigado, amém. Dandara, por que tudo não pode ser mais fácil?
Se os contratos de quaisquer empresas fossem claros e não envolvessem o linguajar-dos-advogados, todo mundo estava bem resolvido. Ninguém se metia em problema. Se ninguém olhasse pra baixo, eu poderia usar bermuda nesses dias que o termômetro marca uns 45 graus. Trabalhar com a corda e a gravata no pescoço não é nada bom. Dandara, Dandara. Se tu não tivesse entrado, talvez eu não quisesse a tua saída. Tudo seria mais fácil se mais gente achasse que o fácil vale a pena.
E hoje me perguntaram se ainda gosto de você, mulher. Veja só se isso é pergunta que se faz pra um cara como eu. Um cara que nem sabe o que responder. Quer dizer, gostar envolve muita coisa. Pode ser muito, pode ser pouco. Posso até gostar da minha caneta azul que borra a página nesse desabafo que leva teu nome. É ponta fina e molhada, oras. Tenta entender, eu gosto de tudo, eu gosto do mundo. Mas acho que de segunda à domingo nesse meu mundo não cabe mais você.
Então vai, Dandara. Me deixa fazer qualquer coisa que amanhã vai ter três sílabas e pronúncia de pro-ble-ma. Quero ser o cara, quero ser esse cara. Esse cara que nem sabe o que quer. Que nem sabe se te quer. 
Se nas segundas se ganhasse em dobro, todo mundo esperaria mais por elas. Se o cinema fosse mais barato, talvez muito mais casais adolescentes (como nós) teriam se formado durante um filme qualquer. E, pensa bem, se os brindes do Mc Lanche Feliz fossem livros, até mesmo o próximo mundo estaria a salvo. Quem sabe até não poderíamos ter pensado em filhos? 
Então, se eu quero que você vá embora, favor culpar a droga do Mc Donald's.
Dandara... - suspiro teu nome que some logo após deixar a boca, rebolando no ar assim como você. Dandaraê, Dandaraí. Por que mesmo que você me fez começar a pensar nisso tudo bem aqui? Só parte. Nós dois.
Que o meu parto eu aguento sozinho.

08 janeiro 2014

E se eu não chegar lá

Se eu não chegar lá talvez ninguém se importe. Talvez você me troque. E, por falta de sorte, vou entender que teria sido sorte cuidar do meu bom senso.
Quem sabe, se eu não chegar lá, amanhã não haja bom dia, bom trabalho; daquele sofá fujam os amassos, e hoje nem boa noite vou dizer.
Se eu não chegar lá não vou ter chego a lugar nenhum, e essa noite vou ser só mais um a entrar pra lista dos que hoje tiraram o dia para morrer.
E se eu não chegar lá eu vou dar trabalho pro hospital, e vai até pegar meio mal ser atendido por alguém que não seja você. Cadê você?
Se eu não chegar lá o caminho terá sido em vão, meio escuro. Vai saber o que tem detrás deste muro? Um rouba-vidas ou algo que nem cheguei a conhecer?
Se eu não chegar lá, talvez eu cause uma saudade. Nada que um dia não acabe. Porque insubstituível mesmo só você. A meu ver.
Caso eu não chegar lá, talvez eu não tenha sido o suficiente, e eu, meio descrente que nem sempre, vá chorar o caminho inteiro para sabe-se-lá-onde-estou-indo.
Eu sei.
Não vão me suportar.
Então, se eu não chegar lá.
Vem atrás.
De mim.
E diz:

Olá :-)

02 janeiro 2014

E se eu parar de rabiscar?

Bloqueei qualquer parte de mim que respingou na escrita. Em meio a estas mudanças do dia a dia, decidi que meu punho não sabe mais ser cursivo e que do meu lápis não sai a-be-cê nenhum. Acreditei na minha própria mentira, na minha própria piada. Sempre fui um piadista de marca fajuta. Acontece que comecei o dia de hoje pensando que não sei mais escrever.
"Desaprendi" - foi essa a ordinária, a palavra escolhida para rotular a inércia de meu abandono linear. Simples assim. Ontem sabia, hoje já não sei mais. Escrever? Quequéisso. Nem me lembro como faz. Mas, espera. Quero fazer. Quer dizer, eu preciso escrever. Sou escritor. Pensa só se o carteiro resolve deixar de entregar cartas. E quando foi que os médicos decidiram não salvar alguma vida? Nunca, nunquinha! Então por que o escritor resolveria que assim, de uma hora para outra, abandonar tudo seria uma escolha sensata? Papinho de preguiçoso.
Teorizei, então. Não procurei nos livros grossos, mas sim fui buscar na minha própria fatia de loucura. Ali, ao lado da racionalidade (gavetas opostas se postas lado a lado funcionam melhor), encontrei o que preferi chamar de solução. E se eu parar de rabiscar? Bem, tanto faz. Estou de férias. É feriado na cidade dos papéis em branco.
E, veja só: enquanto veraneio e devaneio - eis a escrita.